29 de junho de 2005

O ÚLTIMO ESPECTÁCULO

Hoje e amanhã são os dois últimos espectáculos da peça. Tudo chega ao fim.
Foi levantada do nada apenas pela vontade; primeiro a minha e depois dos que aceitaram puxar as cordas, os olhos no céu e o padrão que se ergue em contrapicado.
Um anónimo, depois de ir encher a mula na estreia, foi para casa e escreveu-me um hate-mail. Não lhe pude responder, por ser anónimo, teria preferido que expressasse a sua opinião ao vivo e em directo, ou pelo menos que tivesse a coragem de assinar. Antecipava, ele/ela, com gozo de que os actores representariam quase sempre para um público reduzido. Não se enganou de todo, houve dias muito fracos. Noites em que as pessoas preferiram as pipocas do Optimus Open Air, ou algum programa fácil na televisão. O que não sabe é que as pessoas têm todo o direito a ir ou a não ir ao teatro. E que nem me admira que não vão em massa. Os portugueses imaginam-se incapazes de produzir alguma coisa de interessante; não confiam em si, nem nos outros. Preferem a banalidade de uma cópia de Hollywood a uma comédia portuesa, contemporânea, que lhes dê mais do que o esquecimento. Sim, há bluff por todo lado, sobretudo apoiado pelos dinheiros públicos. Mas nem tudo é bluff. Nem tudo é exercício para o umbigo ou para os 2 neurónios.
Temos é de fazer o que não nos ensinam na escola: a escolher; a distinguir o bom do mau.

28 de junho de 2005

A CARTEIRA

...toca sempre duas vezes, no nosso prédio. Hoje trazia um ror de cartas registadas para vizinhança. Ameaças das Finanças, multas e coisas do género. Só por aqui mora a classe média, mais ou menos artística, mais ou menos de profissão comum. Não temos políticos, nem dirigentes de clubes, nem empreiteiros.
É por isso que a senhora carteira toca à nossa campaínha. No país em que tudo apela à desonestidade como forma de se estar tranquilo.

27 de junho de 2005

O CICLO FECHADO

Li que a administração Busha mandou banir mais 400 títulos das bibliotecas. A desculpa era terem cenas de sexo e violência. Prevê-se que o número de livros proibidos aumente nos próximos tempos.
E eu prevejo que a palhaçada portuguesa, mesmo sem os meninos de portas nos tachos governamentais (estão agora enfiados noutros, claro) não tardará a fazer o mesmo por cá.
Minerva nos dê paciência para atravessar as trevas.
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O SONHO CAVAQUISTA

A pouco tempo de termos como primeira-dama, a poetisa de Boliqueime, percebo que o sonho do marido de um Portugal em que o dinheiro fosse o motor e a causa da felicidade se concretizou.
No centro comercial duas miúdas brincam. Uma diz à outra: "X... Não fujas! Olha... Assim já não te COMPRO NADA". Onde é que foi parar a frase "Assim, já não sou tua amiga!"?

24 de junho de 2005

SESSÃO CONTÍNUA
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Na rua, em baixo, desde ontem, um camião suga sabe-deus-o-quê de uma boca de esgoto.
O trânsito arrasta-se, aumentando o ruído e um barulho monótono, contínuo, que mete os nervos dos gatos da casa em franja, não se cala.
É certo que o país tem muita porcaria para retirar do seu interior... Mas tanta?!!!

23 de junho de 2005

CADEAU BONUS!!! OU PUBLICIDADE DESENCAPOTADA.

Raios me partam se não tinha vontade de fazer isto há anos:

Oferta visitantes do prazer_inculto. Só para esta semana, a penúltima desta série de representações, oferecemos 50% de redução no preço do bilhete de A CIBERNÉTICA.
Para hoje, 5a, amanhã 6a e sábado. 50%.
Basta reservarem (relembro que o número de lugares é reduzido... já para evitar chatices) para o 963950010. Têm é de dizer "Prazer Inculto". Isto vai perturbar o Nuno Martins da produção, mas permitirá assistir à peça, durante estes dias, por metade do preço. Pode ser por escrito, sms, com o vosso nome e do vosso acompanhante. Dois por pessoa. Só para nós :)

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(Espaço Atmosferas, rua da Boavista, 67, em Lisboa - rua do final do Elevador da Bica, em baixo, ou do Belêza- 22 horas)

LOL. Pronto, está feito!
A BANCA

Jorge Sampaio atreveu-se a insinuar que os banqueiros portugueses não tinham um pingo de interesse no progresso do país. Que preferiam o lucro fácil e imediato à mudança que necessita da sustentação financeira de vários.
Ora basta ver os lucros dos bancos privados, os milhões que os filhinhos torram em festas e carros de luxo para se perceber que o nosso presidente não tem razão nenhuma.
É tudo boa gente. Nalguns casos, até Santa!
Pax in argenta (latim selvagem)
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POLÍCIAS

Vi-me, ontem, entalado na rua da Boavista, em Lisboa, entre milhares de polícias e guardas. O que nunca é divertido.
Primeiro que tudo, não sabia que eram tantos. Como continuamos todos a ter medo de andar de noite por certas zonas da cidade, depreendia que não havia pessoal. Afinal, há. Estão é no parlapié nas esquadras. A ver se chega a hora de ir para casa, que é onde se está bem e não se corre riscos.
Milhares de homens (algumas mulheres) gritavam ao som do futebolístico "CAMPEÃO! CAMPEÃO... CAMPEÃO É CAMPEÃO... LSB... LSB... etc", que é uma coisa que se tem ouvido nos últimos tempos. Mudaram foi a letra para "GATUNO! ÉS GATUNO..."... Foi bonito.
A horda dividia-se também na atitude, os mais novos iam em normal protesto. Os mais velhos agrediam a rua com os gritos. De vez em quando, pareceu-me ouvir mesmo alguns "Filho da Puta...". mas deve ter sido impressão minha, tratando-se de forças da ordem tão ordeiras que mesmo quando há gente decepada ou enforcada nas esquadras, nada aconteceu...
Sócrates propôs-se reduzir a despesa pública através da redução de privilégios. Obviamente que todas as corporações onde tocar se vão torcer. Os polícias querem manter um sistema de saúde privado particular, pago por todos nós, para si, família, ex-mulheres, filhos que já não moram com eles, etc. Acho bem. Pressuponho que os militares também quererão a mesma coisa. E todos os outros de quem nós não sabemos. Fazem bem em querer manter as benesses. Eu também gostaria. Se não fosse um dos que se limita a pagar, a pagar, a pagar, recebendo pouco em troca. Como a maioria, aliás.
Venham a próxima greve e manifestação. Diz a História da política portuguesa que os governos recuam sempre. É preciso é apertá-los com os lobbies.

21 de junho de 2005

ESTAR MORTO É O CONTRÁRIO

É bonito ver o frenesim das discussões sobre feriados nacionais e nomes de rua, sempre que morre um escritor ou um pensador em sentido lato. As presidências excitam-se, as câmaras e juntas de freguesia batem no peito com orgulho. E não tarda nada que não surja uma rua dos subúrbios com o nome do falecido.
Há quem diga que os portugueses não acarinham os seus criadores. É falso. Não têm é pressa...
O VERÃO

Os gatos espalham-se pela casa. Sobem escadas, enfiam-se em armários, apreciam - por uma vez - a banheira, em busca do Lugar Fresco. O paraíso dos bichos com pele.
Os gatos aborrecem-se com o Verão. Não é por acaso que se lhe chama "canícula".
Se me encontrarem enroscado por debaixo do lavatório, ao lado dos felinos, não se admirem.

20 de junho de 2005

PROFESSORES
Não sei em pormenor as razões da greve. Fiquei com a ideia que este Ministério teria avançado com uma série de propostas mais polémicas como estratégia negocial. Por exemplo, afirmam que não faz sentido um professor dar formação fora do seu horário lectivo, o que seria uma coisa ridícula porque implicaria entre outros aspectos que os secretários de estado e os deputados não usassem os telefones dos gabinetes ou o tempo em que lá se encontram para tratarem dos seus negócios e processos pendentes dos seus escritórios de advocacia, o que nunca se viu. Enfim, pareceu-me mais moeda de troca que outra coisa.
Os últimos governos têm elegido como alvo os professores (leia-se do ensino básico e secundário porque no superior - que é onde eles ganham a vida - nunca tocam...) e principal razão do desiquilíbrio financeiro e desnorte de prioridades do M. da Educação. Basta entrar numa escola para perceber que isto não faz sentido. Primeiro, há muitos outros funcionários além dos docentes. A maioria bastante improdutiva, para não dizer contraproducente, por sinal. Vão desde a vigilância e (falta de) limpeza às secretarias, etc, etc. Toda essa gente custa dinheiro. Muita é supranumerária.
Depois, tem havido um esforço gigantesco das associações de pais com o beneplácito eleitoral dos governos para acabar com as férias dos professores. Reduzi-las ao mínimo, ao mês de Agosto, quanto muito. Sobre este assunto proponho apenas aos pais esta imagem: pensem que organizavam festas de aniversário para 20 ou 30 crianças, várias vezes ao dia, durante toda a semana. Agora multipliquem isso por 10 meses. No fim, talvez percebam, como eu percebo, por que razão é necessário dar espaço à recuperação dos professores. E, não, não acho que a escola seja um depósito de crianças e adolescentes em delírio. É preciso manter os meninos fora da rua, enquanto os pais trabalham, mas aumentar o horário dos professores para essa tarefa é capaz de não ser solução.
Não sei se os professores têm toda a razão para fazerem greve, mas duvido que sejam a principal causa dos males da educação.

17 de junho de 2005

O STRESS

Houve um tempo em que quando me ligavam em stress à sexta-feira, a minha calma se perdia.
Acreditava que se aquela pessoa estava irritada comigo era mesmo porque eu tinha feito alguma coisa de errado. Mesmo se depois da reflexão não via razão para tal, ainda assim me penalizava.
Depois descobri que são quase sempre os mesmos a tomarem-se de ira ao fim-de-semana. Quase sempre antes de irem para casa para um casamento que já deu o que tinha a dar. Ou de deixarem por dois dias o emprego que os está a consumir de insatisfação.
Hoje, dou-lhes a minha solidariedade. O sentimento de culpa é que deixo com eles, que escolhem todas as manhãs a própria a vida.
COMO DIRIA S.PAULO

Dizem-me os amigos que em Portugal não se pode pedir dinheiro por um bilhete de teatro. Que a malta está habituada a não pagar. Mais: que não é costume pagar-se. Que qualquer preço "é caro". No teatro "sério", leia-se. Pergunto a mim mesmo onde terá começado este porreirismo geral obrigatório e que frequentemente descamba em salas vazias e quase-súplicas para que vão ver o que tanto trabalho deu a montar...
Estarei "cego" ou não deveria todo o trabalho honesto ser compensado?

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(A CIBERNÉTICA)
Foto: António Jorge Gonçalves

15 de junho de 2005

A PRIMEIRA POESIA

Não gostava nada de poesia, na minha adolescência. Até a escola me obrigar a ler Eugénio de Andrade. E desse dia em diante comecei a anotar as coisas de maneira diferente. A leitura do mundo assumiu-se como uma possibilidade poética.
Hoje, por e-mail, recebo do Pen Club a lembrança de alguns dos seus versos que me apetece partilhar:

"Apenas um Corpo Respira.
Um corpo horizontal,tangível, respira.
Um corpo nu, divino,respira, ondula, infatigável.
Amorosamente toco o que resta dos deuses.
As mãos seguem a inclinaçãodo peito e tremem,pesadas de desejo.
Um rio interior aguarda.
Aguarda um relâmpago,um raio de sol,outro corpo.
Se encosto o ouvido à sua nudez,uma música sobe,ergue-se do sangue,prolonga outra música.
Um novo corpo nasce,nasce dessa música que não cessa,desse bosque rumoroso de luz,debaixo do meu corpo desvelado."
E.A.

11 de junho de 2005

BOTÃO VERMELHO

Calculo que já toda a gente conheça... Mas eu descobri-o agora.
Lol!
VOAR SEM MEDO (ou ÍCARO 2)

Num país em que toda a gente se acagaça com medo de falhar e ao mesmo tempo está sempre pronta a abater quem sonha com o prazer de levantar os pés do chão, aqui fica esta imagem.
E o endereço deste site. Talvez a generosidade faça caminho até eles, ao verem a quantidade de coisas inúteis que um dia fizeram sonhar os homens.

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10 de junho de 2005

ÍCARO

Vou-me despachar com o que tenho para fazer e sair à rua. Há luz lá fora. E as pessoas são menos do que o costume na cidade em feriado. É altura dos jacarandás e da feira do livro.
Vou sair à rua para levedar o meu tempo.

9 de junho de 2005

ESTREIA

Esta noite, arranca a nossa peça. Vários meses de trabalho que se podem avistar por um tempo breve de 4a a Sábado. Só até ao final do mês.
Diz a superstição que o ensaio geral tem de correr mal para que a estreia funcione. Por esta lógica, hoje será uma desgraça, lol: os actores estiveram bem, quem assistiu gostou e a música e os vídeos entraram a horas.
Neste fim-de-semana em que quase toda a gente vai assar para as filas de trânsito, vamos lá ver quantos é que aceitam o desafio da contemporânea CIBERNÉTICA.
Mais informações, aqui.

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6 de junho de 2005

NÃO FUI À FEIRA

Parece mentira, mas por causa da peça ainda não coloquei os pés na subida da Feira do Livro. Para um viciado é um esforço razoável.
Chegam-me notícias de que está igual.
Com Homero e muita gente morta a falar.
Calha bem, que os que já cá não estão ainda são os mais interessantes.
O QUE O VIDRO NOS DEVOLVE

Hoje, no reflexo de uma montra, vi um tipo que seguia feliz para o seu trabalho. Não ia com os bolsos cheios de dinheiro, não tinha nada de seu, nem o futuro lhe estava assegurado até à reforma. E contudo, no reflexo, vi esta pessoa que não trocaria de destino por nada.